domingo, 14 de agosto de 2016

MEDO DA MÃE

K. cresceu no meio do turbilhão da alternância entre violência, depressão, honestidade (menos o dia que sua mãe o colocou para falsificar um cheque do seu pai), ignorâncias. O povoado não tinha psicólogos e nem psiquiatras. A mãe de K. procurava terreiros de Umbanda e o Kardecismo para pedir paz e prosperidade. K. mantinha sob total sigilo sua depressão. Uma forte dor no peito. Nos finais de semana ele embrenhava no meio do cerrado que circundava o povoado. Procurava ficar consigo mesmo.
A mãe de K. se reunia com mulheres para julgar quais casas eram mais limpas; quais maridos eram mais generosos com suas cônjuges; falavam dos atores mais lindos das telenovelas.
O pai de K. era um homem honesto, trabalhador. Mas era uma fúria. Quantas vezes ele chegava em casa e atirava as panelas cheias de comida no meio do quintal. Espancava a mãe de K. e tudo era acompanhado por todos os filhos.
Mas o pai de K. morreu. Foi um infarto fulminante. A mãe de K. entrou em depressão. Ela criava um neto chamado Matheus e uma neta chamada Paola. As irmãs de K. eram mães solteiras. A mais velha mancava de uma perna, sofrera paralisia infantil. A outra, a Solange, casou-se com um policial militar e foi-se embora. A partir daí a mãe de K. se transformou. Começou a denegrir os filhos. "Maldita a hora que pari esses filhos". O irmão de K. perdeu um olho. A mãe de K., resignada, começou a cuidar dele. E o irmão de K. inverteu a noite pelo dia. Levanta às 18h, fica acordado até às 8h30. Almoça às 7h30 e tem o costume de comer caldo de feijão e verduras. É a cópia do pai.
K. tem medo da mãe. Ele não se sente à vontade perto dela. K. é bipolar. Dois polos: o pai e a mãe deixaram tal herança para K..