terça-feira, 28 de julho de 2009

O SUPER-HOMEM


Porcaria de diário. Ínfimo diante de milhares de pessoas sentindo o pulsar da existência. A neblina cobria as ruas da pequena cidade. K. estava lá para tentar fugir. Ele estava pensando que tudo era uma emboscada. "Um risco em cada esquina", menos naquela cidadezinha. As mãos que estavam redigindo sua merda de existência agora são esquentadas pelos bolsos da velha jaqueta. É, talvez seja isso: a história é uma velha gagá, vive repetindo-se. Tomara que K. não tenha cometido um plágio em comparar história com velhas gagás. K. não queria nada: nem dor, nem coração, nem felicidade. Foram toneladas de experiências. Pelos seus lábios passaram outros tantos quantos lábios. Leu, comeu páginas e páginas de livros - menos os de auto ajuda. Pendulou em locais luxuosos e casas de putas que serviam de ninhos para baratas, era só cutucar a parede forrada de madeira. K. admitia que era apaixonado pelo ser humano. Histórias pessoais. Quantas vezes ele invadiu almas, perscrutando, tomando conta da alma e fazendo até que a pessoa entrasse em pane com o ego do tamanho de um balão colorido. Mas o ego de K. não era do tamanho do bigode de Nietsche. Até porque Nietzsche era tão sensível que chorou ao abraçar o pescoço de um cavalo, em Milão, suplicando que o cocheiro cessasse as chicotadas. Era um cordeirinho perto de sua irmã. A julgar pelo bigode pode-se tê-lo como um gigante, mas era baixinho. Tudo é inútil. Tudo tudo valor. Resta saber qual caminho tomar. K. voltou para casa sem encontrar os perigos nas esquinas. Dormiu em paz. (Geraldo Magela Matias)

quarta-feira, 22 de julho de 2009

INFÂNCIA


Acabei de perder-me no meio de sentimentos. Não sei mais o que digo.
Destrocei todos os sonhos de fomentos. Não sei mais onde fico.
E tudo parece ser um tormento. Mas eu não ligo.
Estou rindo, estou lento. Não me desligo.
Tudo é muito grande, até mesmo o meu quarto, meu quintal
Tudo é muito grande, até mesmo o meu quadro, meu varal.
Tudo é tão pequeno, até mesmo minha mente que não me desmente:
ainda caibo nas roupas de criança;
até mesmo tenho uma pipa como esperança,
amplamente multicolor,
mas não vou amar loucamente mais que amei
e tudo terá um fim como uma gota de orvalho
sendo apagada pelos raios de sol.

(Geraldo Magela Matias)

sábado, 18 de julho de 2009

MEDO DE AMAR




Faz muito tempo que não vejo
o luar da lua ser exilado
dentro dos meus propósitos;
uma covardia em pleno dia.
Mesmo querendo um beijo
no meio do campo molhado,
resisto e me agarro ao medo.

E o sol engolindo e rindo
da fragilidade do orvalho
que brilha nas pétalas
de rosas em praças públicas vazias

Será que alguma moça linda
está lendo o meu mais novo poema
ou vou continuar como uma
rocha bruta e sem utilidade?


(Geraldo Magela Matias)

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Movimento dos Sem-Causas


K. estava profundamente irritado. Quando K. ficava irado ele gaguejava, mas não chegava a ser violento com as palavras. "Não, não acredito. Abaixo da reportagem sobre os sem-teto anúncios de mansões, palacetes e apartamentos". K. não era esquerda, nem direita, nem centro. Era um niilista que tomava Coca-Cola e não importava-se nenhum cadinho da fórmula do refrigerante. Passava horas a fio sentado num banco de qualquer praça pública. Suas partidas de xadrez demoravam séculos. Mas não suportava quando mexiam de forma dolorosa com o ser humano mais fraco e desprotegido. Nunca ousou usar uma camiseta de Ong clamando a salvação de baleias. Mas vivia distribuindo cobertores e algumas refeições perto do seu apartamento. "Os japoneses não se importavam com mendigos, mas sim com baleias, eles apenas vivem bem por aqui e aposto que ninguém sabe dos motivos". K. cancelou a assinatura do jornal. Queria ter apenas poesia em suas mãos. Poesia marginal, cortante. (Geraldo Magela Matias)

domingo, 5 de julho de 2009

CONFISSÃO


K. anda falando para sua musa que lê Bukowski. Ela não sabe nada além de revistas sobrre fotonovelas. As mulheres que falam com K. sobre Linguística não tocam seu lado sensual. K. confessou que adora mulheres que adoram levar uns tapas na bunda e têm unhas pintadas de vermelho. "Lembra-me dez flores", argumentava. Na barbearia K. era tido como um sujeito burro, mas inteligente. No bar, era o intelectual maluco. Mas estava sempre em companhia de mulheres que ficavam encantadas por ele. Os garçons riam, riam muito. Como podemos achar um conceito exato para amor? Ele deve ter fugido como os patos de The Catcher in the Rye, o Apanhador no Campo de Centeios. É obscuro o lugar para onde forram os patos. K. foi o único tio que não deu Harry Potter para seu sobrinho - mudando um pouco de assunto. Deu o Apanhador. Mas o livro foi para o lixo e não havia nenhum pato dentro da lata e no coração do pai de Larry. Amor pelo que é sensual, bom, desafiador... parece ter acompanhado os patos. (Geraldo Magela Matias)

sexta-feira, 3 de julho de 2009

FRASE DO DIA


'Escrever é uma chatice', diz Chico Buarque na Flip.

POETAS E PENAS


No meio das folhas perdidas
há só vento,
ventania selvagem,
amarelas no outono.
O arrastar de folhas
faz o manto negro
cobrir o mundo;
mas há quem goste.
E quem gosta, gasta
de gastura as pupilas
e as mãos.
Chá, café e vidraças
vibrando.
Algo no coração escreve
saudades de amigos
e cachos de cajus roubados, avermelhados.
Todos distantes.
Ninguém sabe para onde o vento vai,
mas sabe de onde vieram os amigos.
Talvez anjos seguram suas penas
para que nenhum poeta seja vidente,
apenas um amontoado de aço escrevente.